Será que o ditado “O que não se aprende pelo amor, se aprende pela dor” é de fato fiel à forma como nos comportamos após experiências marcantes?
Algumas aprendizagens acontecem em nossa vida após um evento que classificamos como aversivo. Quase ser atropelado, por exemplo, é uma experiência que nos marca e provoca mudanças de atitude. Quando você for atravessar a rua novamente, com certeza olhará para os dois lados com mais cautela.
Mas nem todo evento aversivo gera esse tipo de mudança de comportamento, especialmente quando as consequências são muito distantes dos comportamentos que a geraram.
Imagine como uma dieta inadequada leva anos para resultar em um quadro de obesidade e oferecer potenciais problemas à saúde. Enquanto isso, até chegar em uma consequência negativa, o comportamento alimentar inapropriado traz fortes recompensas de prazer a cada ingestão de um hambúrguer, sorvete ou refrigerante. A satisfação imediata no consumo desses alimentos e a distância temporal até as consequências prejudiciais (pressão alta, diabetes etc.) impedem que estas gerem as mesmas mudanças comportamentais como o quase atropelamento.
Da mesma forma acontece quando observamos o comportamento de estudo. No início do ano, procrastinar, deixar de fazer a lição ou fazê-la de qualquer jeito podem eventualmente gerar broncas de pais e professores, além de notas ruins e outras consequências negativas. Mas, de imediato, esses comportamentos produzem algo muito poderoso e importante para os adolescentes: mais tempo livre para atividades prazerosas, como jogar videogame, falar com amigos, ver séries etc.
Esses comportamentos também evitam contato com algo desagradável – afinal, o estudo é difícil para muita gente. E enquanto continuar difícil e uma fonte de broncas e pressões dos adultos de sua vida, a tendência é o estudante continuar fugindo e se esquivando. Mesmo com a possibilidade de uma bronca posterior, a consequência imediata de evitar o estudo é mais poderosa e pode vir logo após o comportamento de procrastinação. Toda consequência distante tem menos poder sobre a forma como nos comportamos hoje. A possibilidade de reprovação ainda está longe e geralmente não é o suficiente para que o aluno mude de atitude no novo ano.
Às vezes a reprovação (ou quase reprovação) é bastante traumática e traz sofrimento, mas isso não garante que o aluno se torne um super estudante de repente. Pelo contrário, a experiência pode ser tão ruim que tudo relacionado à escola passa a ser mais aversivo, fazendo com que se afaste mais ainda dos estudos.
Em um ou outro caso, o estudante pode até querer mudar seu comportamento logo no início do ano, mas muito provavelmente ele não saberá por onde começar. Querer mudar é uma coisa, mas saber como é outra. A reprovação mostra o que não deve ser feito, mas não ensina o que fazer.
Por isso, é importante um trabalho de acompanhamento desde o início do ano, para organizar a rotina, ensinar um método de estudo, dar feedbacks construtivos e conduzir o aprendizado, sem que seja preciso aguardar o boletim para saber se houve uma melhora ou não.
Lembre-se: as notas no boletim são um diagnóstico tardio de um comportamento, portanto o aluno deve ser monitorado dia após dia pela família, escola e tutores, com foco no processo, no esforço, nas tarefas feitas e na qualidade do estudo.